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São Paulo
18 de setembro de 2024

Novo desafio para a inclusão de tecnologias nas escolas públicas

De fato, não existe nada próximo de um consenso sobre os benefícios do uso da tecnologia para a melhoria dos indicadores de qualidade do ensino em termos de política pública. Embora se saiba que escolas com bons resultados em seu IDEB disponibilizem laboratórios de informática para uso de seus professores e alunos, muitos outros fatores possuem mais relevância na formação da percepção de qualidade de ensino do que o próprio computador usado para fins pedagógicos. Unânime quanto a sua razão de existir, a informática na educação ainda gera discussões e polêmicas em função de diversos fatores que contribuem para que a tecnologia tenha pouco destaque, na prática, nas estratégias de melhoria dos indicadores de educação. <br />
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Antes de pensarmos no PROUCA, que basicamente está disciplinando a forma como os laptops serão adquiridos, a até então recente indisponibilidade de acesso à Internet de banda larga, a ainda incipiente produção de conteúdos pedagógicos alinhados com as habilidades dos professores e, obviamente, a própria habilidade dos professores em utilizar o conjunto hardware-software-Internet formam o conjunto de barreiras que continuam prejudicando a utilização da informática como ferramenta pedagógica. Se somarmos os problemas de manutenção contínua destes ambientes pedagógicos e o custo de aquisição dos equipamentos, então poderemos entender melhor a razão de, após mais de uma década, a informática ainda ter sabor de tabu dentro das escolas. Com o PROUCA, podemos ir do tabu à esperança de que o cenário se altere, mas é ingenuidade pensar que em menos de uma década os resultados desejados serão alcançados em termos de educação pública.<br />
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Embora muitos questionamentos possam ser feitos em relação ao “como” a informática é disponibilizada nas escolas, especialmente nas escolas públicas, não há dúvidas de que o “quando” é agora e o governo, empresas, escolas e a sociedade reconhecem que é fundamental que a educação consiga minimamente refletir a iminente cultura digital, que é praticamente ubíqua nos grandes centros e, cada vez mais, presente no restante do país, para dentro de suas salas de aula. E após mais de uma década, grandes projetos tem alterado o “como” se introduzir e manter em funcionamento todo o maquinário à disposição da informática pedagógica. <br />
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A Secretaria de Estado de Educação de São Paulo, tendo em vista sua infraestrutura e os problemas que enfrentava com relação à manutenção dos seus computadores nas escolas, optou pelo formato de “service desk”, onde os computadores são adquiridos em conjunto com um pacote abrangente de serviços de suporte e manutenção no formato de aluguel. Entre os benefícios deste modelo está a redução do custo de operação de uma rede com mais de 100.000 computadores (OPEX) e um custo de aquisição (CAPEX), se não igual, muito próximo ao do modelo tradicional de pregão. <br />
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Neste modelo, sempre que um computador de uma escola, mesmo de uma cidade distante do centro técnico da Secretaria de Educação, apresentar algum problema, basta que a escola acione o serviço de 0800 para que a empresa responsável pela disponibilização dos computadores seja acionada para efetuar a troca. Além da agilidade, este modelo reduz os custos logísticos associados a uma operação potencialmente complexa e que no passado acabava limitando demais o uso do laboratório de informática no longo prazo.<br />
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Com base em mais de uma década de experiência em introduzir computadores para fins pedagógicos nas escolas, Governo e sociedade, certamente, tem muito que colaborar para que erros do passado não sejam repetidos no PROUCA, principalmente com relação ao “como” as coisas serão conduzidas e executadas. O PROUCA tem o grande mérito de promover um debate sobre os novos rumos da tecnologia na educação. Disponibilizar para os alunos uma experiência individualizada de informática é um grande avanço frente ao tradicional modelo de computadores compartilhados que predomina até hoje, com resultados questionáveis. E considerando as grandes barreiras já citadas anteriormente, pode-se inferir que os problemas tendem a aumentar proporcionalmente, embora o aluno desta vez tenha mais autonomia em sua experiência com a informática.<br />
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Na fase atual, onde o PROUCA está tomando formas, podemos ver muitos acertos do Governo, principalmente em estabelecer, prioritariamente, a isenção de impostos para aquisição de computadores para fins educacionais, através da MP 472 de 16 de Dezembro de 2009. Através da MP, um regime especial de tributação permitirá que os computadores para o PROUCA, e computadores para uso educacional, tenham suspensão da cobrança de IPI, COFINS e PIS/PASEP. Mais do que isso, a própria MP prevê que “o PROUCA tem o objetivo de promover a inclusão digital nas escolas das redes públicas de ensino federal, estadual, distrital ou municipal, mediante a aquisição e utilização de soluções de informática constituídas de equipamentos de informática, programas de computador (software) neles instalados e de suporte e assistência técnica necessários ao seu funcionamento”. <br />
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Desta forma, a própria MP reconhece que apenas a aquisição do computador não é suficiente para consolidar de forma plena um programa como o PROUCA. E também reconhece que tem como objetivo a inclusão digital, e não a melhoria da educação, talvez mais um ato de prudência do que negligência. Além da questão de hardware, há ainda questionamentos sobre a política de software. Neste ponto, talvez, a maior polêmica surgida durante a audiência pública do dia 10 de Fevereiro último tenha sido a obrigatoriedade do uso de software livre como qualificador para o PROUCA. <br />
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Outra polêmica, o espaço de armazenamento do equipamento limitado a 4GB apenas (hoje um netbook de baixo custo conta com um espaço de armazenamento mínimo de 80GB, vinte vezes mais) tende a ser revisto, pois uma limitação de memória é rapidamente sobreposta pela rápida evolução que este tipo de componente apresenta. <br />
Vamos nos focar ao software, portanto. Se o uso da informática na educação está longe de gerar opiniões unânimes, o uso do software livre acaba agravando ainda mais as divergências, já que enfrenta ainda muita resistência por parte do usuário final, pouco familiarizado com esta plataforma.<br />
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Tendo o professor como um dos maiores críticos ao uso do software livre – quando este é sinônimo de Linux – cria-se uma barreira adicional ao sucesso efetivo do PROUCA. Entretanto, sob o ponto de vista de viabilizar o menor custo possível da solução, o uso do software livre, gratuito e de qualidade passa a ser, em um primeiro momento, uma das alternativas possíveis na opinião deste autor. O MEC desenvolve há anos o Linux Educacional. Em sua versão mais recente, o Linux Educacional possui aplicativos compatíveis com sua proposta pedagógica, como a “EduBar”, que permite acesso aos conteúdos disponibilizados no Portal do Professor e que é, na realidade, uma biblioteca digital com mais de 10 anos de contribuições e conteúdos, como vídeos, obras do domínio público e objetos educacionais. É a mesma versão de sistema operacional utilizada nas formações promovidas ou apoiadas pelo PROINFO e, por isso, é a versão mais familiar para os professores.<br />
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Entretanto, ressalvas também se aplicam a esta ideia. Como o PROUCA vai disciplinar a política pública com relação à aquisição da solução, como política pública ele não pode ficar restrito apenas aos critérios de redução de custo de aquisição do equipamento (CAPEX). Em função dos arranjos locais de municípios ou estados, é falso afirmar que a simples adoção do software livre seja capaz de baratear o custo da solução (CAPEX + OPEX). E quando o PROUCA disciplina que apenas será permitido o uso de software livre nos equipamentos elegíveis a isenções do governo, então aqui comete-se um erro, ainda na opinião do autor. <br />
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Primeiro, é necessário determinar qual é o padrão de qualidade do Software Livre e como ele pode ser acessado. Mais que isso, qual será o nível de qualidade garantida para ele. No caso do Linux Educacional do MEC, todas as questões em aberto estariam resolvidas, e é estranho não vê-lo citado nominalmente nas etapas de formulação do PROUCA. Além disso, a obrigatoriedade do uso exclusivo do Software Livre, ou seja, não permitir a instalação de outro sistema operacional sob pena de comprometer a garantia do equipamento, limita de diversas formas a formulação de projetos pedagógicos e de gestão de infraestrutura, além de limitar a liberdade das secretarias de educação em adotar suas políticas próprias de software, o que, em ultima instância, impacta também nas políticas de formação de professores quando estas são conduzidas e executadas de forma descentralizada. Por fim, quando se enxerga no PROUCA um mecanismo que disciplina a aquisição de uma solução de informática composta por um computador por aluno, software e serviços de suporte e manutenção, é necessário um melhor debate sobre quais serão as responsabilidades e possibilidades das escolas, secretarias de educação e empresas (que prestarão estes serviços), principalmente no que se refere aos itens que vão além da compra do equipamento, que vão além do software (um duelo que sempre é polarizado pelo Windows e Linux) e que vão além apenas dos custos de aquisição. <br />
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Exemplo: pensar no Software Livre como a única alternativa possível apenas porque supostamente existe uma redução de custos pode não ser um caminho correto, pois em função das responsabilidades atribuídas às escolas, uma imposição dessas pode ser um ponto desnecessário de atrito. Entretanto, todo o debate do PROUCA precisa ser visto como algo extremamente positivo e que já está gerando dividendos concretos, como a MP 472 que tende a ser para o mercado de educação o que a “MP do Bem” foi para o mercado de informática, regulando assim a forma como o ecossistema deve trabalhar nos próximos anos. <br />
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Como se sabe, os grandes problemas centrais na utilização da informática na educação não estão na barreira da aquisição, e sim nos elementos que dão sustentabilidade ao seu uso relevante, contínuo e de longo prazo. Após mais de uma década com projetos de informática em laboratórios, é fácil imaginar que o PROUCA vai na próxima década gerar muitas oportunidades, ainda sob a suspeita de que muito esforço pode ser pouco relevante na melhoria da educação, porém em condições de existência melhores do que os PCs tiveram no passado.<br />
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(*) Diretor de Operações da MSTech<br />